11 de jul. de 2012

Onna Bugeisha

Fotografia: João Castelo Branco*
Texto: Eduardo Capistrano
*Estrelando: Raquel Deliberali

produção: Fabiano Vianna /  Digão Duarte  / Nina Giusti Galiano








Tinha 12 anos quando ganhou sua primeira espada. Era um tanto — “uma katana do seu tamanho”, disse o tio. A arma não tinha fio, estava velha e maltratada, mas ela a adorava. Na versão da estória que criou, a lâmina tinha passado de mãos em mãos, desde um samurai desonrado que se tornou um dos piores bandidos das estradas do Japão, até ser tirada por soldados Aliados das tripas de um tenente que cometeu seppuku nas trincheiras da Manchúria.
Foi apenas a primeira de muitas. Tornou-se aficcionada por espadas japonesas. Adquiriu outros tantos tantos, além de kodachis, wakizashis, tachis, katanas e nodachis. Colecionava também shinais e bokkens. Montava daishos, os pares de katanas e wakizashis, em suportes por toda a casa. Sua coleção de tsubas, os guarda-mãos das espadas, ocupava uma parede inteira. Tinha redondos e quadrados, funcionais e ornamentais, antigos e novos, réplicas baratas e preciosidades em ouro.
A fascinação contaminou toda a sua vida. Só namorava descendentes de japoneses. Devorava livros e mangás sobre o Japão feudal, assistiu a uma infinidade de animês e filmes que tivessem as armas. Aos 16 anos concluiu que “O Livro dos Cinco Anéis” era o caminho de sua vida. Ela acreditava, realmente, que Musashi, isolado no fim da vida em uma caverna isolada, escrevia aquelas palavras para ela, 350 anos depois.
Dedicou-se a aprender japonês apenas para ler o Go Rin No Sho no original. Começou a frequentar cursos de kendo procurando quem estivesse disposto a lhe ensinar a arte mais tradicional do kenjutsu. Nessa época, fez sua primeira viagem para o Japão. Na terceira viagem, conheceu Kenji. Apaixonou-se perdidamente.
Formou-se e fez pós-graduação em História do Japão. Era piada para ela, que se sentia não uma estudiosa, mas uma habitante daquela época e lugar. A graduação quase coincidiu com a chegada de sua o-yoroi, uma armadura tradicional samurai, um presente de Kenji. Era desengonçada e nem um pouco apropriada para o uso. Mas ela não a usaria. Quando saía às noites, levava apenas seu daisho preferido, sobre um colete de kevlar. Mas também levava seu primeiro tanto. Adulta, já sabia que era uma réplica barata comprada por seu tio em algum brechó. Mas não fazia diferença quando ela o enfiava nas tripas da escória que cometia o erro de cruzar seu caminho.

João Castelo Branco
Blog: 
http://casadojoao.blogspot.com

Eduardo Capistrano
Nasceu em Curitiba, Paraná, no ano de 1980. Contista desde 2002, é autor de "Histórias Estranhas" (2007) e "A Quarta Dimensão" (2011).
Saiba mais em http://edcapistrano.blogspot.com

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