Texto: Eduardo Capistrano
Tinha 12 anos quando ganhou sua primeira
espada. Era um tanto — “uma katana do seu tamanho”, disse o tio.
A arma não tinha fio, estava velha e maltratada, mas ela a adorava. Na versão
da estória que criou, a lâmina tinha passado de mãos em mãos, desde um samurai
desonrado que se tornou um dos piores bandidos das estradas do Japão, até ser
tirada por soldados Aliados das tripas de um tenente que cometeu seppuku
nas trincheiras da Manchúria.
Foi apenas a primeira de muitas.
Tornou-se aficcionada por espadas japonesas. Adquiriu outros tantos tantos,
além de kodachis, wakizashis, tachis, katanas e nodachis.
Colecionava também shinais e bokkens. Montava daishos, os
pares de katanas e wakizashis, em suportes por toda a casa. Sua
coleção de tsubas, os guarda-mãos das espadas, ocupava uma parede
inteira. Tinha redondos e quadrados, funcionais e ornamentais, antigos e novos,
réplicas baratas e preciosidades em ouro.
A fascinação contaminou toda a sua vida.
Só namorava descendentes de japoneses. Devorava livros e mangás sobre o Japão
feudal, assistiu a uma infinidade de animês e filmes que tivessem as armas. Aos
16 anos concluiu que “O Livro dos Cinco Anéis” era o caminho de sua vida. Ela
acreditava, realmente, que Musashi, isolado no fim da vida em uma caverna
isolada, escrevia aquelas palavras para ela, 350 anos depois.
Dedicou-se a aprender japonês apenas para
ler o Go Rin No Sho no original. Começou a frequentar cursos de kendo
procurando quem estivesse disposto a lhe ensinar a arte mais tradicional do kenjutsu.
Nessa época, fez sua primeira viagem para o Japão. Na terceira viagem, conheceu
Kenji. Apaixonou-se perdidamente.
Formou-se
e fez pós-graduação em História do Japão. Era piada para ela, que se sentia não
uma estudiosa, mas uma habitante daquela época e lugar. A graduação quase
coincidiu com a chegada de sua o-yoroi,
uma armadura tradicional samurai, um presente de Kenji. Era desengonçada e nem
um pouco apropriada para o uso. Mas ela não a usaria. Quando saía às noites,
levava apenas seu daisho preferido,
sobre um colete de kevlar. Mas também
levava seu primeiro tanto. Adulta, já sabia que era uma réplica barata comprada
por seu tio em algum brechó. Mas não fazia diferença quando ela o enfiava nas
tripas da escória que cometia o erro de cruzar seu caminho.
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