Conto: Celly Borges
Ilustração: Johandson Rezende
–
Ora, que patético você dizer isso.
–
Como patético se é esta a única verdade, Joana?
–
Emily, é provável que o fato tenha se dado de outra forma, mas ninguém tenha
contato com os detalhes reais.
–
Pois vou contar todos os detalhes e você que julgue como reais ou não.
“Aconteceu
logo depois que eu entrei em casa. Voltava do chá da tarde com as madames do
clube de leitura, que acontecia na casa de uma querida amiga, Mary. Apesar de
ser boa com algumas pessoas, ela era arrogante com outras. Mas isso não vem ao
caso.
Acontece
que cheguei um pouco mais cedo do que o normal, pois o chá estava frio e as
bolachas, amolecidas. Entrei em casa como normalmente fazia, pensando que
estava só, pois meu marido trabalhava até tarde nas quintas-feiras, mas ouvi
uma correria no andar superior e meu sangue gelou. Travei no chão e não soube o
que fazer.
Fiquei ali,
escutando a correria, quando alguém começou a descer as escadas...
– Oh, meu bem, não
sabia que chegaria tão cedo – disse John, meu marido.
Por poucos minutos
pude sentir uma alívio, mas logo algo apitou dentro de mim e percebi que John
estava apenas de cueca e meias brancas, todo suado. Meus instintos apurados
disseram que havia algo errado. Olhei para ele e logo para a escada. Quando
ameacei subir, ele me segurou pelo braço. O olhei assustada com o gesto
inesperado.
– Sente-se aqui. Já
que cheguei cedo – disse-me ele, apontando a cadeira da mesa da cozinha –, vou
preparar uma xícara de chá para nós.
Ele sabia que eu
havia ido para o chá com as madames do clube. Estranhei ainda mais e disse que
aceitaria sua oferta, mas que precisava tirar a roupa desconfortável.
John me olhou
tenso, então eu passei por ele como um foguete e subi até nosso quarto.
Em nossa cama, onde
tantas vezes trocamos carícias, juras de amor e muito sexo, estava sentada uma
jovem. Ela era muito jovem. Sorriu, era linda. Nunca tinha visto tamanha
beleza.
Ela me olhou e
sorriu. Seu sorriso não tinha nenhum remorso, era falso, então eu voei sobre
ela. Pulei em seu pescoço com a faca que havia pegado sobre a mesa lá embaixo,
sem que John percebesse.
Quando meu querido
e compartilhado marido enfim chegou em nosso quarto, sua bela amante estava no
chão. Ao levantar seu rostinho desfigurado ele deu um berro de desespero,
enquanto o sangue sujava todo o tapete.
– Sua louca– ele
berrava. E eu estava estática. – Tirou dela toda a sua beleza! Acabou com a
única mulher que eu amei em toda a minha vida infeliz ao seu lado!
Ele também trouxera
uma faca”.
– Eu morri pela
beleza de outra.
– Então agora somos irmãs, em meio aos
túmulos e lápides esquecidos.
– Neste ambiente
que me causa repugnância. Até que o musgo cubra nossos nomes.
Celly Borges
Nasceu em São José dos Pinhais, PR, onde sobrevive. É apaixonada pelos livros. Mantém
há cinco anos o blog Mundo de Fantas no
mundo dos livros (mundodefantas.blogspot.com.br). Autora de contos de
horror e fantasia. Também escreve literatura infantil
sob o nome Gisele Borges. Enfim, profissão: leitora.
Gostei muito do conto! Uma pena as duas fantasmas não serem a esposa e a amante...
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