Ilustração 1 (cima): Hafaell Pereira
Ilustração 2 (baixo): Elis Marina B
Você
chega em casa e seu marido obeso está esparramado no sofá da sala, bebendo
cerveja e assistindo bundas na tv. Você olha pra ele e sente náuseas. Nem dá
pra acreditar que aquele cavalheiro por quem você se apaixonou tenha se
transformado nesse homem nojento que arrota sem cerimônia enquanto te olha com
esse maldito ar indiferente.
Nem na cama ele não presta mais. Faz-se uma copulação
onde você só sente prazer porque é muito sensível e sempre se entrega de corpo
e alma. Você faz amor! Amor, amor! Você entra em comunhão com o Universo a cada
gozo! Ele transa. Fantasia outras mulheres, se excita, enfia em você e goza. Um gozo besta, sem nenhuma
intensidade. A seguir, se é noite, ronca. Se é dia, te beija a boca já sem
entusiasmo, murmura um "eu te amo" fingindo sentimento - porque, ah!,
só você sabe o quanto ele finge sentimentos! - e vai pro chuveiro já
conversando sobre os problemas dos negócios. Você deita nua no tapete de seu
quarto, ainda delirante por seus merecidos orgasmos. Enquanto o vê sair do
banho para barbear-se, observa com crescente desprezo o modo como ele admira e
se orgulha das próprias banhas. Você entra no banheiro, ele bate em sua bunda
te chamando de alguma mulher da mídia e sorri daquele modo malicioso. "Tu
é mesmo boa, mulher!".
Você quer vomitar. Já é demais! Você é uma
heroína, se desdobra entre filhos, trabalho, casa. Ah!, a casa! No início vocês
eram jovens e ele gostava de ser admirado por aceitar e pôr em prática a ideia
da divisão das tarefas domésticas. Tudo estava por escrito e vocês revezavam
tarefas para não ficar cansativo demais para ambos. Mas depois, com a promoção
no emprego dele você compreendeu que era muito esgotante que ele pusesse a
roupa na máquina de lavar ou passasse aspirador de pó no tapete ao chegar do
trabalho. Além disso vocês teriam uma empregada, já que ele ganharia mais.
Mas na verdade nunca houve empregada, pois o seu dinheiro não deu e seu marido sempre inventando desculpas para não arranjarem uma.
Então todo o serviço doméstico sobrou pra você. Seus filhos até poderiam ajudá-la um pouco, pois tem 10 e 13, mas seu marido argumenta que ele ainda é muito novo para certos serviços, quando na verdade você sabe que ele não quer ver o "homenzinho" da casa limpando privada. Em compensação dá-lhe revistas de bundas e peitos.
Mas na verdade nunca houve empregada, pois o seu dinheiro não deu e seu marido sempre inventando desculpas para não arranjarem uma.
Então todo o serviço doméstico sobrou pra você. Seus filhos até poderiam ajudá-la um pouco, pois tem 10 e 13, mas seu marido argumenta que ele ainda é muito novo para certos serviços, quando na verdade você sabe que ele não quer ver o "homenzinho" da casa limpando privada. Em compensação dá-lhe revistas de bundas e peitos.
Olhando pro espelho, pros próprios olhos. Ele se gaba
tanto de seus olhos verdes: "Ah, que vontade de matá-lo. Como o desprezo."
Seu marido dorme.
Você se deita ao seu lado e o abraça, como todas as noites. Desta vez não diz
que o ama. Com cuidado para que ele não acorde, amarra suas mãos na cabeceira
da cama. Prende seus pés nos pés da cama. Ele resmunga, diz algo ininteligível.
Mas seu sono é profundo.Você senta em cima do homem. Sabe que seus filhos estão tranquilos a essa
hora, em São Paulo ,
de férias.O alicate está em sua mão direita. Você está pronta!
Por onde começar? Decepar seu
pênis ou furar seus lindos olhos verdes? De que modo ele sofrerá? Você se
delicia com a idéia de imagina-lo gritando de dor... Você imagina o sangue
escorrendo, molhando toda a cama, ensopando lençóis, colchão, travesseiro...
Nesse momento percebe seu pau ereto. E percebe o próprio clitóris molhado de tesão. Pensa que talvez um gozo final antes da prisão - pois você sabe que será presa após decepar seu pênis e furar seus olhos- seria uma vingança gostosa.
Nesse momento percebe seu pau ereto. E percebe o próprio clitóris molhado de tesão. Pensa que talvez um gozo final antes da prisão - pois você sabe que será presa após decepar seu pênis e furar seus olhos- seria uma vingança gostosa.
Rasga rápido a calcinha, abaixa-lhe a cueca e senta
fundo no desejado pau. Seu marido acorda e curte a situação, embora não entenda
nada, pois você nunca foi sadomasoquista, pelo menos não com ele. Então o brocha goza. Você pira: "É agora! É esse o
momento!" E quer executar seu plano.
-Ei, amor, não estamos em “Instinto Selvagem”, eu já gozei, acabou a
brincadeira. Vamos, me desamarre! E abaixe esse alicatinho!
Você se sente ridícula. Não tem mais vinte anos, não é loira e odeia o
tal filme. Droga, seu plano já era! Você deixa o alicate cair, sai de cima,
veste sua camisola. Apática. Nenhuma lágrima, nenhuma expressão. O vagabundo sem
entender bulhufas pede que o desamarre.Você sai do quarto. O marido chama para desamarrá-lo. Você sai. Você dá partida no carro. Ele fica berrando seu nome com ódio. Seus pés pesam sobre o
acelerador. É madrugada. Há um carro de polícia na sua cola. Você pára o
carro, tira a camisola. O guarda te olha espantadíssimo. Ameaça te prender por atentado ao pudor.
"Isso ainda existe?", você pergunta sorrindo. "Existe". Mas
você sabe o que ele quer. Você abre a porta.
“Hum... como você é linda...” Você abre as pernas. Abre seu espírito para um
coito desajeitado num carro de motor econômico.
Depois o policial vai embora,
dizendo pra dirigir com cuidado. Sem orgasmo e sem roupa, você volta pra
casa. A essa altura o diabo gordo daria um jeito de chamar alguém para
soltá-lo. Um vizinho, talvez. Não é tempo de perguntas. O fato é que o marido
te olha sem saber o que pensar ou sentir, de pé, braços cruzados e boca aberta. Pela primeira vez em tanto tempo a sala estaria num silêncio oco:
sem TV nem som, nem brigas por controle remoto. Você observa a cena, nua,
cabelos embaraçados, cara de quem “transou e não gozou". Queria
chorar. Mas você não pode. Sabe o quanto chorará depois, sozinha, trancada
no banheiro.
- Eu quero o divórcio. Você disse. Você quem
disse. O marido esboça uma
articulação de palavra, mas a voz não sai.
Está muito espantado. Só te olha. As mãos se descruzam e caem ao lado do
corpo, encurvando seus ombros. Mas não se move. Permanece lá em pé num
silêncio estarrecedor. Divórcio. Separação de bens, de filhos, de almas. Foi você quem quis.
Agora fica querendo chorar, me olhando fixo no fundo dos olhos, dos meus olhos.
-Ainda te quebro em mil pedaços, espelho maldito!
-Ainda te quebro em mil pedaços, espelho maldito!
Milene Lopes Dias
Palhaça Sombrinha do grupo curitibano Cia dos Palhaços. Também é atriz e contadora de histórias e atua em espetáculos infantis com outros grupos. Ama escrever e deseja ser escritora desde criança. Site: www.ciadospalhacos.com.br
Conheça mais de seu trabalho em: flickr.com/photos/hafaell
eu gostei muito! fiquei curioso sobre a camisola...a cor, o modelo...onde ela ficou depois do sexo com o policial...se voltou pra casa sem ela...
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