Ilustração: André Ducci
Petrônio era o filho do caseiro da
chácara dos Aguilar, um casal de idosos que praticamente ignorava a existência
do menino. A verdade é que poucas pessoas se relacionavam com o garoto recluso
e ensimesmado que, apesar de toda aparência, não era nenhum anjo. Petrônio
tinha suas bizarrices, por exemplo, o seu mais obsessivo hobby, o cemitério em miniatura
que estava construindo. Em um canto pouco explorado da propriedade dos Aguilar,
para cada pequena lápide que ele entalhava em madeira, havia um animal sepultado.
Começou enterrando insetos, tais
como: baratas, besouros e grilos, até o dia em que achou um rato morto e
providenciou seu funeral. Durante algum tempo se satisfez com a simples coleta
de cadáveres, todavia, impaciente para expandir sua necrópole, passou a cometer
pequenas atrocidades. A primeira vítima foi o canário dos Aguilar, vulnerável
em sua gaiola. Depois alguns gatos que
visitavam inadvertidamente a chácara. Também armou arapucas com as quais capturava
ratos, sapos, lagartos e qualquer pequeno animal que por desventura cruzasse
seu caminho. O cemitério de Petrônio era o seu orgulho e agora havia se
expandido por um bom trecho, até as proximidades do pomar.
Certo dia, voltando da escola,
Petrônio avistou uma ambulância em frente à chácara. Aproximou-se cauteloso e, antes
de passar pelo portão, observou que era a sua mãe quem recebia o atendimento. O
garoto correu casa adentro e trancou-se no quarto, de onde pode ouvir as
sirenes dos carros de polícia se aproximando.
Minutos antes, a mãe de Petrônio
estava coletando laranjas no pomar, quando percebeu um odor forte de
putrefação. Ela, uma senhora religiosa e cheia de superstições, ficou
transtornada ao deparar-se com centenas de pequenas cruzes e lápides de
madeira. Impulsivamente, ela pegou o rastelo e começou a revirar todo o terreno
na intenção de desmanchar aquele cenário grotesco. Revolver a terra daquela
maneira fez com que o cheiro nauseabundo se alastrasse absurdamente potencializado,
mas isso não foi o pior. O rastelo enroscou em algo e, quando a mãe de Petrônio
fez força para livrar a ferramenta, acabou fisgando um sapato. Era o sapato que
o senhor Aguilar calçava na noite em que desapareceu misteriosamente.
A visão do pé necrosado emergindo
da terra, somada à náusea causada pelo cheiro forte, fizeram com que a mulher
desmaiasse. Ela foi encontrada pela senhora Aguilar e o restante dos
acontecimentos pode ser deduzido. Agora, Petrônio apenas desenha suas lápides,
pois é tudo que lhe permitem no sanatório.
Daniel Gonçalves
Radicado em Curitiba, casado com Amarilis e pai de Leon, Layla e Alice. Teve toda sua vida permeada pela paixão à literatura, artes visuais e música. Editor da revista LODO e co-editor da revista LAMA, escreve e desenvolve ilustrações para esses periódicos, além de ter participado de outros projetos, como as revistas Fascículo, Arte & Letra e Jandique. Paralelamente aos trabalhos artísticos, desenvolve projetos de arquitetura e design.
facebook.com/danielgoncalvesarte
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